O que diferencia o Malbec do lado esquerdo daquele do lado direito da cordilheira dos Andes? Isso é o que te contamos a seguir.
Falar de Malbec sem que o nome da Argentina nos venha à cabeça ainda é difícil. No entanto, poucos sabem que esta variedade francesa chegou primeiro no Chile. Isto ocorreu em meados de 1840, nada menos que na Quinta Normal de Santiago. Neste lugar aterrissou esta cepa que logo se propagou pelas zonas de Itata, Maule e Bio–Bío e, em seguida, pelos vales de Cachapoal, Casablanca e Colchagua, este último provavelmente o mais reconhecido para seu cultivo atual.
Na Argentina, entretanto, a história do Malbec começou em 1853 quando o presidente Domingo Faustino Sarmiento quis replicar o modelo agronômico chileno, inaugurando a Quinta Normal de Mendoza. Foi assim como o ampelógrafo francês Michel Pouget, que havia trabalhado no projeto chileno, trouxe as primeiras mudas da cepa para a Argentina, iniciando um trabalho no qual conseguiria adaptar a variedade de uva às condições climáticas e ao solo argentino. O que ele não sabia, no entanto, era o futuro promissor que esperava por ela.
Diferente do Chile, o desenvolvimento do Malbec na Argentina foi rápido. Os resultados de sua vinificação foram tão bons que em pouco tempo se converteu na cepa mais plantada do país. Atualmente, a Argentina conta com cerca de 43.000 hectares de Malbec, os quais representam 38,6% das variedades tintas do país. Já no Chile, o Malbec conta com apenas 2.361 hectares plantados, conforme indicou o último Registro Vitícola Nacional realizado pelo SAG (Serviço de Agricultura e Pecuária do Chile).
Dito isto, o Malbec que cresce do lado esquerdo da cordilheira dos Andes é muito diferente daquele que se situa à direita. No caso da Argentina, é impossível não mencionar o trabalho do investidor italiano Atillio Pagli, um dos primeiros em insistir no potencial das vinhas velhas de Malbec nos anos 90. Foi graças a ele que aumentaram as plantações, especialmente na área do vale de Uco e de San Juan. Porém, foi apenas no ano 2000 que na Argentina se começou a falar de terroir. Até então, o Malbec era utilizado para dar cor e concentração para outras variedades tintas ou para produzir vinhos de excelente cor com muita concentração de fruta, alto teor alcoólico e um longo período de envelhecimento em madeira. Assim preferia o mercado norte-americano, para onde se dirigia a maior parte de suas exportações.
Produto do trabalho de viticultores independentes e da tecnologia é que o Malbec argentino ampliou seu estilo de vinhos robustos para uma versão mais moderna. Vinhos mais suculentos, frescos e leves foram o resultado de colheitas mais precoces, macerações carbônicas, menor uso de madeira e da guarda em tanques de concreto. Os quais, além disso, diversificaram-se segundo seu terroir. Luján de Cuyo, Maipú, Rio Negro, os vales de Jujuy e Uco são alguns dos lugares onde a cepa é cultivada. O vale de Uco, com seu clima quase desértico, é um dos mais reconhecidos e onde se localiza o vinhedo de solo aluvial a 1000 metros acima do nível do mar que dá origem ao Terrunyo Malbec 2016. Um vinho de intensa cor vermelha, aromas de frutas negras, especiarias, notas florais, de entrada doce e taninos persistentes.
No Chile, no entanto, os expoentes do Malbec estão bem menos diversificados em termos de terroir. A grande maioria dos vinhedos se situa na zona do vale Central, ou seja, em terrenos mais planos. Por sua vez, alguns vinhedos de mais de 200 anos em vales como Maule e Colchagua se destacam por entregar vinhos excepcionais. Isto, somado ao trabalho de vinícolas que partiram em busca de terroirs interessantes para seu desenvolvimento, oferece um panorama que acrescenta, de todas as maneiras, vinhos notáveis ao cenário nacional. De vinhedos relativamente jovens, nos vales do Maule e de Colchagua, são provenientes o Marques de Casa Concha Malbec 2018 e o Gran Reserva Malbec 2020, respectivamente. Dois vinhos que se afastam do uso excessivo de madeira nova para dar protagonismo a sua vibrante expressão frutada.
O Marques de Casa Concha Malbec 2018, proveniente de um vinhedo de solo de origem coluvial em uma zona equidistante entre a cordilheira e o mar em Pencahue, é um vinho tremendamente complexo. Com múltiplas camadas de aromas de frutas vermelhas, negras, especiarias doces e um toque mineral, é frutado, denso e vibrante na boca. Enquanto o Gran Reserva Malbec 2020, com D.O. Marchigüe próxima ao mar, provém de um vinhedo com encostas e terraços próximos à ribeira do rio Tinguiririca. Guardado principalmente em barris usados, este vinho se destaca por seus aromas a cereja, cassis, cedro e pimenta-do-reino branca, com taninos suaves, doces e uma deliciosa concentração na boca. Dois vinhos com um final equilibrado, ideais para aproveitar a ocasião e fazer um brinde no Dia Internacional do Malbec que se comemora neste 17 de abril.